segunda-feira, 28 de novembro de 2011

O Brasil em perspectiva

Alberto Luiz Schneider
Artigo originalmente publicado na Revista Real. Janeiro 2011
O azedume das últimas eleições contribuiu para embaçar o olhar do país para si mesmo. De um lado, havia a exposição maciça das conhecidas conquistas sociais dos últimos anos, como "nunca dantes na história deste país". De outro, uma tentativa de desqualificar os ganhos, ora atribuindo à sorte, ora à estabilização econômica da era FHC, ora dizendo que tudo continua com sempre esteve.
Uma maneira de olhar a realidade – sem o ufanismo e a desqualificação, ambos politicamente orientados – é olhar o país em perspectiva comparativa, cotejando-a com o passado e com os outros países. Nesse sentido, os indicadores do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) são preciosos, sem esquecer que os dados são criações humanas, falíveis, e não a verdade revelada.
Antes convém entender o que é o IDH. Trata-se de uma medida comparativa empregada para classificar os países de acordo com o grau de desenvolvimento humano ("elevado", "médio" e "baixo"). A estatística é uma composição de dado, formado pela expectativa de vida ao nascer, escolaridade e PIB per capita, recolhidos a nível nacional, através de metodologia internacionalmente consagrada. Anualmente, os países membros da ONU são classificados de acordo com essas medidas. O IDH também é usado por organizações públicas e privadas para mensurar o desenvolvimento de regiões, cidades, bairros.
O IDH de 2010, divulgado no dia 4 de novembro de 2010, mostra o Brasil na 73ª posição entre 169 países. Os cinco primeiros colocados são, pela ordem, Noruega, Austrália, Nova Zelândia, Estados Unidos e Irlanda. O cinco últimos são Zimbábue, República Democrática do Congo, Níger, Mali e Burkina Faso. O Brasil vem melhorando sua posição no ranking da ONU. Ano passado, o país ocupava a 75ª posição na classificação (houve mudanças metodológicas, sem as quais, o país teria avançado mais posições).
O IDH brasileiro evidencia uma realidade constrangedora: a liderança econômica do Brasil na América Latina não se reflete no campo social. Enquanto o Brasil está na 73ª posição, o Chile (45ª), Argentina (46ª) e Uruguai (52ª) estão em outro patamar, bem à frente. Mesmo México (56ª) e Peru (63ª) estão em melhores condições. No quesito econômico, o Brasil se equipara ou supera boa parte de seus vizinhos sul-americanos, a diferença está na questão educacional, que contribui severamente para a depreciação do índice brasileiro.
Na última década, a expectativa de vida dos brasileiros aumentou 2,7 anos, a média de escolaridade cresceu 1,7 ano e os anos de escolaridade esperada recuaram em 0,8 ano. A renda nacional bruta teve alta de 27% no período. Como se pode ver, quanto às questões econômicas vamos relativamente bem e não devemos menosprezar a capacidade de gerar riqueza.
Além de melhorar significativamente o nível educacional, o Brasil precisa diminuir a desigualdade social e regional. O IDH não mede a desigualdade social, mas capta a desigualdade regional, evidenciando a existência de grandes diferenças socioeconômicas entre os estados brasileiros, como se pode observar na lista abaixo:

1° - Distrito Federal – 0,874
2° - Santa Catarina – 0,840
3° - São Paulo – 0,833
4° - Rio de Janeiro – 0,832
5° - Rio Grande do Sul – 0,832
6° - Paraná – 0,820
7° - Espírito Santo – 0,802
8° - Mato Grosso do Sul – 0,802
9° - Goiás – 0,800
10° - Minas Gerais – 0,800
11° - Mato Grosso – 0,796
12° - Amapá – 0,780
13° - Amazonas – 0,780
14° - Rondônia – 0,756
15° - Tocantins – 0,756
16° - Pará – 0,755
17° - Acre – 0,751
18° - Roraima – 0,750
19° - Bahia – 0,742
20° - Sergipe – 0,742
21° - Rio Grande do Norte – 0,738
22° - Ceará – 0,723
23° - Pernambuco – 0,718
24° - Paraíba – 0,718
25° - Piauí – 0,703
26° - Maranhão – 0,683
27° - Alagoas – 0,677
O desafio que se apresenta, não apenas aos três níveis de governo a serem empossados em janeiro, mas a toda sociedade brasileira, é avançar dramaticamente na qualidade da educação e diminuir consideravelmente a desigualdade, tanto de classe como região. Mas não se melhora a educação apenas com escolas boas, como supõe esperança liberal, mas também melhorando o conjunto da vida dos mais pobres. É necessário integrá-los no consumo e na cidadania, melhorando a renda (via esforço privado dos indivíduos e o auxílio do Estado, ajudando os pobres a crescerem através de políticas públicas específicas, como ocorre em toda Europa Ocidental).
Além de garantir a oferta de serviços públicos universais, não como favor, mas como direitos. Nesse sentido, é alentadora a promessa da presidente eleita de erradicar a miséria absoluta, pronunciada no discurso da vitória. A sociedade brasileira espera e deve cobrar o cumprimento do contrato social assumido com os eleitores, através do ritual democrático. Por outro lado, é desalentadora a frase postada no twitter, no mesmo dia, por Mayara Petruso, propondo o seguinte: "Nordestino não é gente, faça um favor a São Paulo, mate um nordestino afogado!". Ainda falta muito para que superemos o ranço de atraso, demofobia, racismo e pobreza, inclusive de espírito.

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